domingo, 10 de janeiro de 2010

Oscar Quiaque


O Oscar Moreira, mais conhecido como Oscar Quiaque, era o homem mais rico da minha região. Não me recordo o porquê do Quiaque. Nem sei se era apelido próprio ou se por herança. Pra dizer a verdade, nem mesmo tenho certeza da grafia. Poderia ser Kiac ou Quiac. Por falta de elementos comprobatórios, vou adotar o Quiaque. Era proprietário de uma fazenda grande, que tomava toda uma serra, chamada de Serra do Oscar. Lá nascia o córrego Canjerana, que deu o nome a toda área que ele banhava. A Serra do Oscar era nosso indicativo meteorológico. Se embranquecesse da chuva, podia se organizar para receber a dita em poucos minutos. Lá sempre chovia primeiro.

Oscar era um velho bem apessoado. Muito alto, calças folgadas, quase sempre de algodão. Camisas também de algodão e de mangas compridas. Chapéu grande, de feltro e de coco alto. Era uma figura imponente. Falava pouco, não visitava os vizinhos. Ele, Dona Izabel e Jucão, seu filho mais velho, viviam sozinhos num casarão construído no início do século. Não tinha automóvel e quando ia ao arraial, que era muito raro, só a cavalo. Comentava-se na região que era extremamente sovina. Levava bananas na algibeira do arreio, para não precisar gastar na viagem. Que trazia as cascas de volta para dar aos porcos. Se recebesse uma visita, fazia questão de levá-la pro alpendre. Era muito educado. Nunca deixava uma visita ir embora sem tomar um café.

“Zabela, faiz um moca aí pra nós. Pópô açúcar e café”. A visita ficava satisfeita, afinal iria tomar um café forte e com bastante açúcar. Café com substância. Quando a Izabel chegava com o café, era uma surpresa. O café era ralo e quase sem açúcar. O “pópô” não era “pode pôr”, era para “poupar” café e açúcar.

Seu vizinho, o Juca do Amâncio, conseguiu ajuntar dinheiro e coragem e comprou uma Pick-up Jeep, ainda era da Willys Overland. Sonho de consumo dos roceiros daquela época. Mas a única estrada que chegava à casa do Juca era uma antiga, daquelas de carro de boi. Muito tortuosa, íngreme, cheia de erosão e de cavas. Por ela nem a Pick-up passava. Então, o Juca se socorreu com o Oscar. Depois de uma boa conversa, o Oscar permitiu ao Juca que abrisse uma estrada, desde que fosse a enxadão e em troca de alguns favores com o serviço da Pick-up. Ou seja, montaram uma parceria que atendia muito bem a ambos.

Num dia bastante chuvoso, após passar bastante trabalho com a Pick-up na subida da serra, o Juca encontrou com o Oscar à espera na beira da estrada. Ele trazia um cacho de banana.

- dia, Juca!
- dia, Sô Oscar!
- tá ino pá cidade?
- tô.
- bão! Me faiz um favor?
- pois não!
- ocê leva esse cacho de banana e vende ele pra mim?
- tá!
- aí, com o dinheiro, cê manda consertar esse munho, traiz um saco de sal, dois quilo de cebola, cinco quilo de açúcar e um par de butina pro Jucão. Com o troco, traiz uma brusa pra Zabela, pois o frio tá começano com essa chuvarada.

- e o tamanho da butina do Jucão?
- uai, sô, dois quatro de pareia.
- pois não, sô Oscar!

E lá foi o Juca do Amâncio remoendo o acordo com o Oscar Quiaque. Afinal, a venda das bananas sequer dava para pagar o conserto do moinho e muito menos a botina 44 do Jucão.


Ariquemes, 10/01/10

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