sábado, 10 de outubro de 2009

Roceiro ... não mais ...

Coitado do roceiro! O cara agora tem que se singularizar. Tem que saber se o aproveitamento da propriedade e se sua função social são racionais e adequados. Ou seja, tem que estar com o GUT - Grau de Utilização da Terra - devidamente posicionado. Mais ainda, aferir continuadamente o Grau de Eficiência na Exploração. É o GEE. Se estes índices não estiverem calibrados, é desapropriação na certa. Do outro lado da cerca tem um sem-terra acompanhando o cumprimento das metas do coitado do roceiro. Prancheta na mão, periodicamente, a conferir e a mensurar os atingimentos.

Agora é ficar de olho no Índice de Lotação Mínimo, na Área Efetivamente Utilizada, na Área Aproveitável e na Área Declarada. E a Reserva Legal? Está averbada? E as Áreas de Preservação Permanente? Qual a melhor opção, cultura perene ou temporária? O que impacta mais ou menos no GUT e no GEE? Qual o Ponto de Equilíbrio do sistema? Mas, e o mercado? Está comprando o quê? Qual o preço? Então, o que produzir? Mas, e a bolsa? Como os preços das commodities estão se comportando?

Pronto, agora na roça é assim. Planejar, organizar, controlar e avaliar todas atividades com vistas a fugir de uma desapropriação. Aí está a meta do roceiro: fugir da desapropriação. Este, doravante é seu objetivo maior. Taylor, Fayol, Max Weber e outros serão leituras obrigatórias. Talvez adotar a Qualidade Total na propriedade. Enxada, foice, arado, machado agora terão que receber a companhia das ferramentas administrativas: os fluxogramas, 5W/2H, Diagrama de Causa e Efeito e o do Pareto. A coisa não está nos eixos? Então que vá rodar o PDCA.

Outras ferramentas tornar-se-ão necessárias para possibilitar o atendimento dos ditames ambientais. Agora é assim, tem que cumprir metas e não agredir o meio ambiente. Uma guerra em duas frentes. Vai precisar do teodolito para medir as diferenças de níveis, afinal morro agora é APP. O GPS (Sistema de Posicionamento Global) tem que estar na algibeira sempre, para conferir os limites da reserva e das matas ciliares. Não se pode esquecer a HP, afinal o roceiro tem que estar em dia com seus cálculos e projeções financeiras. E o PRAD, já foi assinado? Será cumprido antes da morte chegar? É uma verdadeira guerra psicológica, associada à guerra pela sobrevivência.

É o roceiro, ou melhor, o vigarista, segundo Minc, entrando no século 21. Esta geração de roceiros vai fazer história. Último dos moicanos. Parece estar findando a roça poética, a roça caipira. A tranquilidade trocada pelo estresse. Agora não há mais tempo para ouvir o som do silêncio e nem da água descendo o regato. Não mais se separa o cantar dos pássaros. Não mais se conhece a rês pelo mugido. Não mais se assenta no barranco para organizar a vida, enquanto pesca. Não mais tempo para recordar, mas, sim, para se preocupar. Uma vida em jogo. Um sonho como uma isca na ponta de uma vara. Apenas um derrotado com o olhar triste e desolado para o outro lado da cerca a indagar: até quando irei suportar? Quando será minha vez? E quando meu corpo não mais puder sustentar o GUT e o GEE? Então, não mais nada terei?


Ariquemes, 10/10/09

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